A insustentabilidade da gratuidade
Vivemos num mundo capitalista. Tudo se negoceia.
É bem verdade que desde os primórdios do tempo se não havia dinheiro para trocar por aquilo que queriamos, davamos à troca outra coisa que já não queriamos ou cujo valor, aos nossos olhos, era inferior ou equiparável.
É assim que ainda hoje fazemos.
Trocamos coisas. Compramos coisas. Pedimos coisas. Somos capazes de destruir outro só para termos algo que desejamos e que está na posse desse outro.
Tudo com base no nosso desejo individual; no fundo... no nosso egoísmo.
Se alguém nos oferece algo, logo pensamos que teremos que dar algo em troca, ou no exacto momento ou daí a uns tempos, também para não "parecer mal".
Oferecemos coisas ou fazemos coisas muitas vezes com o mesmo objectivo de ser compensados de alguma forma, porque "parecerá mal" não receber de volta a atenção que démos.
Chegamos ao cúmulo de desconfiar de quem nos dá algo de forma gratuita, ou seja, sem desejar nada em troca. Construímos ditados populares para essas situações, de tão irreais que são.
Mas ainda há quem dê (claro que muito raramente) algo de forma gratuita... sim! gratuita...
Quando descobrimos uma pessoa que nada nos exige em troca tentamos obter dela o máximo possível.
Não falo apenas de bens materiais.
Falo acima de tudo de sentimentos.
Sim, até nos sentimentos somos egoístas no que damos e no que recebemos em troca. Exigímos em troca sentimentos de quem nos rodeia que por vezes ultrapassam em muito o valor do que foi dado.
Poucas são as pessoas que nutrem por nós sentimentos de forma gratuita, desinteressada. Poucas são as pessoas que nos oferecem objectos ou momentos de forma gratuita, desinteressada.
Vivemos hoje, tal como no passado, e viveremos no futuro com a insustentabilidade da gratuidade. Não creio que as pessoas mudem. Somos assim por natureza. É esta a nossa natureza, a humana. Mas, por vezes... seria bom que todos entendessemos que, por vezes, os nossos sentimentos para com pessoas que nos rodeiam são verdadeira e puramente gratuitos. E que, se essas pessoas nos quiserem retribuir com algo, que seja apenas com a velha fórmula do "um sorriso", em vez de, na estranha insustentabilidade da gratuidade, nos retribuirem com agressividade.
Vale a pena pensar nisto, e tentar deixar de sermos egocêntricos.
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